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No palco da história: a Casa da Ópera de Ouro Preto 

Atualizado: 31 de out.

Olá, viajantes e amantes da história! Aqui é a Sueli, sua guia de turismo em Ouro Preto. Hoje, vamos abrir as cortinas de um dos lugares mais icônicos da nossa cidade: o teatro Casa da Ópera. Vamos espiar pelos bastidores e descobrir alguns fatos curiosos sobre esse monumento único. E preparem-se, pois essa é uma história cheia de surpresas.


Já pensaram como um teatro tão icônico, o mais antigo das Américas em funcionamento, nasceu em plena corrida do ouro? A inauguração, em 1770, não foi casual, mas sim o resultado das mudanças sociais e econômicas daquela época. Podemos não nos atentar, mas um teatro representava um espaço revolucionário dentro da cidade colonial do século XVIII. E hoje, quero te levar para os bastidores dessa história fascinante!


Neste post:



Casa da Ópera de Ouro Preto. Foto: Thiago Santos.
Casa da Ópera de Ouro Preto. Foto: Thiago Santos.

Antes da Casa da Ópera: palcos de rua e Festas Religiosas


Na vibrante Vila Rica do início do século XVIII, o teatro e as manifestações culturais não aconteciam em um prédio fechado, mas sim nas ruas. Ou seja, as ruas foram o primeiro grande palco de Vila Rica.


Festas imponentes como o famoso Triunfo Eucarístico de 1733, paravam a cidade! As irmandades religiosas e a câmara municipal organizavam espetáculos com palcos improvisados (os famosos "tablados") e ruas decoradas que duravam apenas o tempo da festa. 


Antes do prédio que conhecemos, houve uma tentativa de um teatro fixo em 1751. Era uma estrutura mais simples, que alguns descreviam como um "curral", parecida com os corrales espanhóis. Curiosamente, para que o povo pudesse assistir da rua, chegaram a derrubar sua parede da frente! Isso mostra como o teatro ainda era pensado como um evento público e aberto.


Mas a elite mineira, cada vez mais rica e influente, sonhava com algo mais parecido com a Europa.


Casa da Ópera
Visão interna das tribunas e plateia da Casa da Ópera de Ouro Preto. Foto: Ane Souz.

O Governador, o Contratador e o Poeta


A Casa da Ópera tal como a conhecemos hoje, tem pelo menos três nomes de grande influência ligados a sua construção:


O Financiador: João de Souza Lisboa. Um contratador português que, apesar da origem humilde, fez uma fortuna imensa em Minas. Foi ele quem financiou a obra.Erguer um teatro era uma forma de transformar seu capital econômico em prestígio social.

O Político: Conde de Valadares. O governador que chegou a Minas em 1768. Para ele, um teatro era um símbolo de poder e civilidade, uma maneira de trazer a arte das cortes europeias para a colônia.

O Intelectual: Cláudio Manuel da Costa. Um dos maiores intelectuais da colônia e figura central do Arcadismo e da Inconfidência Mineira. Para ele, o teatro era o lugar perfeito para desenvolver suas peças e reunir outros nomes da literatura local.


Além desses nomes, o teatro de Ouro Preto logo passaria a reunir em seu interior um sem número de artistas, poetas, autores, tradutores, pintores, figurinistas, atores e tantas outras profissões até então desconhecidas. 


Um cardápio para todos os gostos


Apesar do nome, a Casa da Ópera não se dedicava apenas à tradicional ópera italiana. O repertório era um verdadeiro mosaico, que incluía uma programação para cada tipo de público. 


Para a elite a grande atração era a ópera italiana. Obras de mestres como Pietro Metastasio e Carlo Goldoni entravam em cartaz com regularidade. Para garantir a bilheteria, as comédias e entremezes de tradição portuguesa e espanhola eram sucesso garantido. O teatro também abria espaço para o drama religioso local. A peça São Bernardo, escrita por Cláudio Manuel da Costa, é o melhor exemplo. 


Essa mistura mostra como a Casa da Ópera era um espaço de intensa troca cultural. Equilibrava o desejo de distinção da elite, a necessidade de ser comercialmente viável e a importância de ter uma relevância local.



Casa da Ópera de Ouro Preto. Foto: Thiago Santos.
Tribuna de honra da Casa da Ópera. Foto: Thiago Santos.

Mulheres em cena 


Uma das grandes inovações da Casa da Ópera de Ouro Preto foi a presença de mulheres atuando. As informações históricas sobre a presença de mulheres, em uma época onde somente os homens podiam atuar (inclusive nos papéis femininos), ainda é escassa, mas diversos estudos afirmam que a prática foi pioneira em Vila Rica. Em uma carta, o dono do teatro se gabava de ter "duas femeas que representão", e dizia que uma delas era até "milhor que as do Rio de Janeiro". O material é citado por Mariana França em seu estudo detalhado sobre o teatro de Ouro Preto. 


Mas quem eram essas mulheres quase esquecidas pela história? O que sabemos é que a alma artística do nosso teatro colonial – os atores, os cantores e, principalmente, os músicos – era formada por negros e mestiços, tanto escravizados quanto libertos. Então é quase certo que as primeiras mulheres a atuar em Ouro Preto, e quiçá em Minas Gerais, fossem negras ou pardas. 


E por que isso acontecia? Se pararmos para pensar, a cultura afro-brasileira sempre teve uma ligação muito forte com a música e com a arte. Essa alquimia cultural, que é uma marca da nossa identidade até hoje, nasceu na divisão social do Brasil colonial. As irmandades religiosas, por exemplo, não eram apenas espaços de fé, mas também verdadeiras escolas de arte para a população negra e mestiça (veja o exemplo de Aleijadinho). Elas formaram um verdadeiro "proletariado cultural" que servia a elite branca, mas que com o tempo criou o seu jeito de se expressar. 


Então, quando imaginamos as primeiras atrizes da Casa da Ópera, temos que ter em mente que esse era um teatro nos moldes da cultura europeia, bancado pela riqueza do ouro tirado da terra pelo trabalho escravizado e cuja arte era feita, em grande parte, por essas mesmas pessoas oprimidas. 


O palco, portanto, era um espelho da sociedade: um lugar de arte, mas também de representação das profundas divisões e contradições do nosso passado. A cor e o som daquele espetáculo eram dados por esse corpo artístico não-branco, e entender isso é fundamental para compreender a verdadeira história do nosso teatro.


Beatriz Brandão: a dama do teatro ouro-pretano


Em uma época em que o espaço feminino na sociedade era tão restrito, Beatriz Brandão não foi apenas uma espectadora nas frisas do teatro. Ela era o espetáculo! Poeta, musicista, educadora e uma verdadeira agitadora cultural, ela era uma das figuras mais respeitadas e influentes de Vila Rica no início do século XIX.


A grande ligação dela com a nossa Casa da Ópera tem data e um motivo muito especial: a visita de Dom Pedro I a Minas Gerais, em 1822. A recepção organizada por Beatriz no teatro da cidade foi notícia nos folhetins. 


Dom Pedro I
Dom Pedro I. Foto: Wiki Commons.

E isso não é lenda, viu? O jornal da época, o "Abelha do Itacolomi", documentou tudo em 1825. A publicação descreve que, após um discurso de elogio ao imperador, uma "Senhora Mineira" cantou um hino de sua autoria. E uma nota de rodapé no mesmo jornal entrega o segredo: essa senhora era a nossa Beatriz Brandão.


Hoje, quando levo grupos para visitar a Casa da Ópera, adoro contar essa história. Peço para que todos fechem os olhos por um instante e tentem imaginar a voz de Beatriz ecoando por aquele espaço cheio de história. 


A Casa da Ópera, como um espaço de performance, oferecia um ambiente único onde uma mulher como Brandão podia assumir um papel de liderança pública que teria sido inaceitável noutras esferas dominadas por homens, como a política formal ou as forças armadas. Ou seja, mais uma vez o palco da Casa da Ópera serviu de espaço para importantes debates sociais. 


Teatro, Poder e Conspiração: A Inconfidência nos camarotes


O teatro foi o centro da vida política e social de Vila Rica, um palco onde o poder e a conspiração se encontravam, literalmente, sob o mesmo teto.


Mas o que torna a plateia da nossa Casa da Ópera tão fascinante é que, lado a lado com as autoridades portuguesas, sentavam-se os futuros Inconfidentes. Isso mesmo! Figuras como Cláudio Manuel da Costa, um dos idealizadores do teatro, e o pai de José Álvares Maciel, outro nome central da Inconfidência Mineira, tinham seus próprios camarotes. Intelectuais como Tomás Antônio Gonzaga e Alvarenga Peixoto certamente frequentaram o espaço dada a grande ligação dos poetas arcadistas com o mundo teatral. 


O momento em que a política e a arte se chocaram com mais força foi na noite de 14 de julho de 1793, aniversário da Queda da Bastilha, o grande símbolo da Revolução Francesa. E isso apenas um ano depois da execução de Tiradentes, quando o medo e a repressão ainda pairavam sobre Vila Rica.


Naquela noite, a peça encenada foi "Zaira", do filósofo iluminista Voltaire, um autor cujas ideias sobre liberdade e críticas à tirania inspiravam revolucionários em todo o mundo. A peça, embora se passasse nas Cruzadas, falava de intolerância, poder absoluto e amores impossíveis – temas que encontravam um eco profundo no coração dos mineiros. 


A Casa da Ópera, que nasceu para ser um símbolo da ordem portuguesa, se transformou, naquela noite, num espaço de contestação. 


Casa da Ópera, Ouro Preto.
Fachada da Casa da Ópera. Foto: Pelo Brasil.

Uma visita ilustre


Em abril de 1881, o Imperador D. Pedro II, chegou a Ouro Preto durante sua viagem pela província. A presença de jornalistas de importantes veículos da Corte, como a Revista Ilustrada e o Jornal do Commercio, garantia que as ações do Imperador fossem amplamente divulgadas. 


Dentro deste itinerário, Ouro Preto ocupou uma posição central. D. Pedro deixou uma nota tímida sobre a Casa da Ópera. Em seu diário encontramos:


“19 de abril 1881: Enfim assisti ao drama, o Capitão Paulo de Alexandre Dumas, no teatro que é menor, porém bonito e muito mais elegante que o de Sabará. Terminou depois da meia-noite.”

Essa nota revela um detalhe interessante. Mesmo com o declínio do ciclo do ouro no século XIX, a programação do teatro parecia se manter atual, apresentando uma peça de Alexandre Dumas, um dos nomes mais populares do cenário europeu. 


Conclusão 


Quem diria que um único local, pudesse esconder tantos segredos e histórias tão incríveis, não é mesmo? A Casa da Ópera continua sendo um palco vivo, onde a genialidade artística do povo mineiro e os sonhos de liberdade do Brasil colonial se encontraram.


Não deixe de conhecer esse palco. Aqui você sentirá a verdadeira alma de um dos projetos culturais mais ambiciosos do Brasil Colônia! Ah, e não se esqueça, estarei por aqui para ser sua guia através das histórias e curiosidades de Ouro Preto. Basta clicar no botão abaixo e conferir os passeios disponíveis. 


Espero que tenham gostado de conhecer os bastidores desse lugar incrível! Deixe seu comentário e até a próxima viagem!




Algumas fontes e sugestões de leitura:


MAYOR, Mariana França Soutto. Espetáculo Disforme: O trabalho teatral da Casa da Ópera de Vila Rica (1769-1793). 2020. Tese de Doutorado – USP, São Paulo, 2020.


PEREIRA, Cláudia Gomes. A poesia esquecida de Beatriz Brandão (1779-1868). Revista Navegações, jan./jul. 2010.


BRESCIA, Rosana Marreco. Os teatros públicos na capital das Minas setecentistas: da casa da Ópera de Vila Rica ao Theatro do Ouro Preto. Lisboa: Universidade Nova de Lisboa; Centro de Estudos em Sociologia e Estética Musical, 2011.


PEDRO II (Imperador do Brasil). Diários de D. Pedro II (1840 – 1891). Arquivos do Museu Imperial. Disponível em: https://museuimperial.museus.gov.br/diarios/. Acesso em: 5 set. 2025.



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